terça-feira, 2 de agosto de 2016

O HOMEM QUE MATOU A MORTE

Foto: Getty Images
1 de Agosto de 1976. 40 anos atrás, Niki Lauda disputava o título da F1 com seu rival, o britânico James Hunt, da McLaren. Uma rivalidade de equipes e pilotos com personalidades completamente distintas: O hardworker x O festeiro, e por aí vai. Enfim, naquele final de semana em Nurburgring, o "Inferno Verde", o austríaco liderava o campeonato e largava em segundo, justamente atrás do arquirrival.

Com a chuva caindo no extenso circuito, à época com 23 quilômetros de extensão e mais de 200 curvas, a largada foi adiada em meia hora pois as equipes não sabiam se iriam correr com pneus slicks ou de chuva (o circuito gigante tinha pontos secos e molhados, por isso tamanha incerteza). Depois de completada uma volta, os pilotos viram que era inevitável a opção pelos slicks. Por isso, 14 carros foram para os boxes, incluindo Lauda.

Em uma curva à direita de alta velocidade, a Ferrari do austríaco derrapou e bateu num guard rail. O capacete foi arremessado e o tanque de combustível perfurado. O capacete era da marca AGV, modelo X1. O problema é que ele era diferente das outras marcas.  Por exemplo, não havia vários tamanhos para o piloto escolher de acordo com o tamanho da cabeça, mas sim o casco era feito em um único tamanho grande e eles iam colocando espuma no forro conforme ficasse folgado na cabeça, ou retirando se ficasse apertado. Esse capacete não tinha o visto da SNELL (Órgão mundial responsável pelo teste de capacetes de automobilismo) e, no caso do Lauda, muita espuma foi colocada pra ficar firme na cabeça, mas ainda assim, na hora da batida, a espuma se comprimiu e o capacete voou, deixando ele exposto só com a balaclava, que não dá conta de segurar o fogo por muito tempo. (Trecho retirado do comentário do Fabio Henrique, no Fórum da F1 Brasil no VK)

O carro voltou para o traçado em chamas e ainda foi atingido por outro carro. Lauda inalou muita fumaça e como o circuito era muito grande, não havia equipes de resgate e de incêndio por perto. Com isso, os próprios pilotos que realizaram os "primeiros socorros" (entre eles o compatriota Harald Ertl e o britânico Guy Edwards, ambos da Hesketh e o italiano Arturo Merzario, da Wolf-Williams), retirando Lauda do carro. Ele ficou consciente e gritava, urrava a todo tempo, dizendo que estava sendo queimado. A ambulância chegou dez minutos depois e colocou oxigênio nele.

Foto: Auto Guide


Lauda acredita que perdeu o controle do carro em virtude de um nova peça que conectava o braço da suspensão traseira ao bloco do motor, feita em magnésio ao invés de aço, como eram as peças anteriores. Até hoje ninguém sabe o que de fato ocorreu. Enfim, Lauda foi levado primeiramente para o hospital de Adenau, o mais próximo do autódromo. Depois, para um outro especializado em queimaduras e no domingo foi levado para o Hospital Universitário de Mannheim, onde fez tratamento intensivo. Além das queimaduras elevadas na cabeça, mãos e pulsos, Lauda inalou muitos gases tóxicos. Durante o tratamento, o quadro se agravou: A equipe médica liderada pelo Dr. Eike Martin não estava conseguindo reverter o intoxicação. Depois de quatro dias, muitos consideravam como provável a morte do piloto austríaco. Enquanto isso, Enzo Ferrari convidava Emerson Fittipaldi, que estava na Copersucar, para substituí-lo na próxima corrida, na Áustria. O brasileiro recusou.

Um padre foi chamado para dar a extrema unção (ritual católico de despedida) a Lauda. Reza a lenda que ele, ainda entubado, teria expulsado o padre a pontapés. Curiosamente, após a visita do religioso, Lauda voltou a reagir rápido, sempre com muita disciplina e superou o quadro crítico, surpreendendo os médicos. Depois de um tempo, Lauda disse que precisava sair do hospital e correr porque disputava o campeonato ("Ou eu volto logo a correr ou abandono o automobilismo", disse). Enfim, depois de apenas 2 GPs fora (Áustria e Holanda), Niki voltou a correr no GP da Itália, em Monza. Realizou muitos exames e foi liberado pelos médicos. Na corrida, chegou em quarto, ovacionado pelos tifosi. Inacreditável! Depois de pouco mais de 40 dias de um dos acidentes mais graves da história da F1, Niki Lauda estava de volta, firme e forte para buscar o bicampeonato!


Foto: Reprodução

O resultado final acredito que vocês já sabem: A história desse campeonato foi retratada no filme Rush, lançado em 2013 (quem não viu VEJAAAAAAAA!). Na corrida final, no Japão, o acordo era dar uma volta e regressar aos boxes, em razão da forte chuva. Lauda recolheu. Hunt, não. O diretor de prova disse que era necessário largar por causa dos acordos com a TV. Diferentemente do mito que "Lauda abandonou por medo", o austríaco abandonou porque não havia condições de ter corrida. Com isso, Hunt seguiu na prova e foi campeão daquela temporada por um ponto.

Como o próprio disse, Lauda cometeu o maior erro da vida dele: Não ter agradecido Arturo Merzario por tê-lo socorrido no acidente. A reconciliação veio apenas 30 anos depois, quando foi realizado um evento por Bernie Ecclestone em Nurburgring, 2006, relembrando o incidente. Os dois percorreram o local juntos e participaram de um programa especial para a TV alemã.

Esse é o polêmico Niki Lauda, que no ano seguinte foi bi-campeão na Ferrari, se aposentou, voltou a correr e ainda conseguiu o tricampeão em 1984, na McLaren, aposentando-se definitivamente da F1 em 1985. O circuito de Nurburgring só retornou a F1 em 1984, pois passou por uma grande reforma e teve a sua extensão diminuída para cerca de quatro quilômetros. Portanto, Lauda voltou a correr no local onde quase perdeu a vida, mas que acabou matando a morte. Até!




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