terça-feira, 24 de janeiro de 2017

O REI ESTÁ DEPOSTO

Foto: Sutton Images
A história de Bernie Ecclestone e da Fórmula 1 se confundem. Não existe um sem a presença do outro. Pelo menos até hoje, e em março começaremos a nos acostumar com isso. Presente desde os primórdios quando tentou ser piloto (sem sucesso), passando por dono da vencedora Brabham até virar o grande líder do esporte nos últimos 40 anos, a Era Bernie chegou ao fim.

Bernie foi demitido da empresa em que ele ajudou a construir um império tecnológico, moderno e bilionário. A F1 será eternamente grata a ele, exemplo de liderança, empreendedorismo, carisma (por que não?), administração, marketing, negócios e inovação. Tudo isso formou a F1 de hoje, sinônimo de modernidade e organização (você pode ver o perfil que eu escrevi sobre ele ainda em 2015). Mas...

A fórmula se desgastou. Se o estilo ditatorial e altamente concentrado em si mesmo permitiu o crescimento da categoria nas décadas anteriores, o mesmo não poderia ser dito agora. Com a audiência caindo cada vez mais, a falta de interação com o público jovem e a teimosia na utilização das redes sociais para interação com o público são alguns dos problemas que a F1 e agora a Liberty Media irão enfrentar pela frente. Todas as decisões passavam pelas mãos de Bernie, que com o passar do tempo não se atualizou aos novos tempos e suas ideias ficaram anacrônicas e atrasadas, refletindo no espetáculo da categoria dentro e fora das pistas.

Bernie permitiu a F1 sair do centro europeu para desbravar o "novo mundo" do Oriente Médio, atraindo mais dinheiro e, como consequência, a saída de circuitos tradicionais, diante de valores exorbitantes e fora da realidade, assim como as eternas ameaças de exclusão de outros centros tradicionais (e até de fato, como a Alemanha).

O automobilismo agradece uma vida inteira dedicado aos negócios na F1 e será eternamente grata pelo crescimento financeiro e midiático da categoria nas últimas décadas. Bernie, para o bem e para o mal, é o responsável por tudo positivo e negativo que vemos no circo, e essa impressão pode demorar décadas para ser desfeita, se é que vai ser.

OS NOVOS MANDA-CHUVAS

Foto: Divulgação/Twitter
Esses três homens terão a responsabilidade de tocar a F1 sem Bernie Ecclestone, algo praticamente inédito na história, se considerarmos que antigamente não havia a complexidade existente no mundo atual. 

Começando pela esquerda: Sean Bratches, de 56 anos, será o responsável por gerir os direitos comerciais da F1. Ele trabalhou durante quase três décadas (ou 27 anos) na ESPN americana, trabalhando como vice-presidente de vendas e marketing. Seu desafio será as negociações de transmissões da categoria para além da TV a cabo (em praticamente todo mundo, sendo o Brasil uma das exceções), como na internet, nem que seja gradual, como treinos livres, por exemplo.

O da direita vocês conhecem: Ross Brawn, icônico dirigente campeão por Benetton, Ferrari e pela sua própria equipe, com última passagem pela Mercedes. Irá comandar os direitos esportivos da F1. É um cara bastante experiente, que conhece os bastidores da F1 pela sua longa atuação como dirigente e, consequentemente, conhece a política ardilosa das equipes do circo. A sua grande missão é, assim como Bernie, percorrer os caminhos para não ser dobrado na guerra contra os times e seus chefões. Por ser mais jovem e estar trabalhando até recentemente na Mercedes, Brawn está mais ligado com as inovações tecnológicas, sendo assim uma peça importante para futuras mudanças de regulamento e composição dos carros.

Para finalizar, o bigodudo do meio. É o chefe da porra toda. Chase Carey, presidente e CEO da Liberty Media, grupo que comprou a F1. Ao que tudo indica, em breve eles irão adquirir 100% das ações (hoje possuem 65%), que pertencem a Delta Topco (empresa irmã da F1). A FIA já aprovou os planos da empresa, que foram mostrados aos acionistas na semana passada. O grupo de telecomunicações americano adquiriu a F1 em um acordo de US$ 8,5 bilhões (R$ 27 bilhões). Primeiro, foi comprado a Delta Topco e 18,7% das ações da CVC Capital Partners por US$ 747 milhões em dinheiro. No total, a Liberty Media investirá US$ 4,4 bilhões e assumirá débitos de US$ 4,1 bilhões.

A expectativa de todos é uma mudança de gestão. A mentalidade americana busca mais a competitividade e o equilíbrio entre as forças, ao contrário da visão europeia e da própria F1 desde os primórdios: o desenvolvimento tecnológico dos carros, onde quem não tem dinheiro não terá vez. No mundo de hoje, esses valores precisam ser revistos, pois a F1 não pode ficar refém das montadoras como está hoje. A categoria precisa dar suporte as garagistas. Como era bonito ter Jordan, Minardi, Tyrrell, entre outras no grid. Hoje, vimos apenas Force India, Sauber e Haas nesse conceito, nem tão exato assim. As três possuem dificuldades financeiras. O resto, tirando as tradicionais Williams e McLaren, que também capengam, são montadoras. Diminuir o excesso de regras, tornar as corridas mais interessantes e mais atrativas para a mídia e o público e uma linguagem que chame a atenção dos jovens são alguns dos desafios a serem superados pelo conglomerado americano.

Os americanos já sinalizam com uma proposta para cortar os benefícios da Ferrari, por exemplo. Os italianos recebem uma bonificação anual altíssima por estarem na F1 desde o início, em 1950. Deve existir uma tentativa de negociação. Os italianos, por sua vez, não gostaram e devem, mais uma vez, ameaçar abandonar a categoria. A queda de braço começa por aí... são apenas especulações, mas o novo grupo vai encarar encrencas como essa para manter a F1 como está para depois fazer as melhorias que todos desejam.

Isso me deixa cada vez mais ansioso para o começo da temporada, que sinalizará o início de uma nova era para a F1. Em tempos de de "pós-verdade", amplamente utilizado recentemente e eleita a palavra do ano de 2016, segundo o dicionário Oxford. o "pós-Bernie" irá demorar muito tempo para se ter uma análise conclusiva, onde serão necessárias décadas para definir se o impacto da "nova F1" pode ser comparada ao "mundo de Bernie" e se isso teve mais defeitos do que virtudes. O que resta, agora, é apenas esperar para ver.

Até!


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Olá, esse é o espaço em que você pode comentar, sugerir e criticar, desde que seja construtivo. O espaço é aberto, mas mensagens ofensivas para outros comentaristas ou para o autor não serão toleradas.