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Foto: Getty Images |
Grandes rivalidades encerram-se quando, obviamente, os dois
não têm mais o que dar, um dos dois já é muito superior ou quando os parâmetros
de competição não são os mesmos.
Será que as rivalidades realmente acabam? Só ver o caso
Hamilton e Vettel, por exemplo. De Vettel jogar o carro e querer brigar até a
admiração pública mútua, o que mudou? Bem, Hamilton conquistou dois títulos
contra o alemão, que entrou em declínio. Não era mais um adversário direto, o
principal. Concorrência superada.
Claro: os posicionamentos extrapista também fazem a
diferença, mas os dois não são vistos como iguais porque Hamilton aniquilou
qualquer dúvida que pudesse existir entre ele e Vettel.
O texto fala de outro rival do Sir: o maior da carreira.
Sim, muito maior que Rosberg. Tão intensa quanto explosiva, ela também ajudou a
moldar a carreira do maior nome da história da categoria, em números.
A rivalidade com Alonso esfriou na última década pelo motivo
óbvio: o espanhol, pelo temperamento difícil, deixou de ocupar os principais
assentos da F1. Relegado ao pelotão intermediário pelas escolhas equivocadas da
carreira, não haveria o que disputar. A rivalidade estaria no passado e no
campo da hipótese.
Ou Alonso voltaria ao topo ou Hamilton teria que baixar o
padrão. Aconteceu a segunda opção. Nesse meio tempo sem disputas relevantes, os
dois manteram a boa política. Elogios mútuos, homenagens quando o espanhol saiu
da F1 pela primeira vez e muito respeito. Para Hamilton, faz todo o sentido:
valorizar o bicampeão por ter dividido a mesma equipe quando estreante e no
auge de Fernando só engrandece o feito.
Se Alonso e Hamilton estão distantes nos números, em termos
de qualidade não. Muito pelo contrário. É claro que a comparação fica
prejudicada pela carreira errática na gestão de escolhas que a Fênix fez, mas
aí há um bom debate: quem é ou foi melhor?
Não é esse o intuito do texto de hoje. Na verdade, a
abordagem é simples: com os dois no pelotão intermediário, ambos disputam os
mesmos objetivos. Tudo bem, a Mercedes está alguns degraus a frente. No
entanto, nunca esteve tão fragilizada em uma década, comparando-se com si mesmo
e os rivais.
Então, num ambiente e num esporte naturalmente competitivo,
com pessoas que competem desde a infância no kart, tudo vale alguma coisa. Não
é só apenas a vitória ou um título. É espaço, prestígio, ego, a vitória
psicológica.
Hamilton e Alonso juntos sempre vai ter aquela lembrança
cada vez mais distante de 2007. Quinze anos. Os dois mais longevos do grid.
Agora, há chance maior de competir. Por isso o incidente de ontem não é apenas
um erro de cálculo ou algo de corrida. É simbólico.
É retrô e vintage, porque remete a um passado relativamente
próximo e está em ótimo estado de conservação. Para Alonso, tem uma importância
maior. A chance de tirar uma casquinha, de mostrar o que poderia ter sido se
simplesmente fizesse uma leitura melhor da carreira e do temperamento. Por isso
a reação explosiva no rádio.
Evidente que isso é normal no calor do momento, mas reparem:
“Hamilton só sabe largar quando está na frente”. Há, no entendimento do
espanhol, uma deficiência no Sir, mascarada por ter sempre um carro competitivo
e/ou dominante a carreira toda enquanto o espanhol precisou se “provar mais”.
Hamilton deu o pulo do gato que Alonso gostaria quando foi
para a Mercedes. O resto é história. Por isso que há mais animosidade do
espanhol do que o contrário. Quem perde não esquece. Claro, eles ficaram
empatados em pontos em 2007 e perderam o título para Raikkonen.
Alonso era o bicampeão e sucessor de Schumacher. Hamilton
era apenas o novato protegido por Ron Dennis que, com o passar do tempo, provou
que também era um piloto diferente. Não só em 2007, mas vocês já sabem...
Hamilton e Vettel “roubaram” o trono que estava destinado a
ser de Alonso, o responsável por encerrar a Era Schumacher. Foi encerrado pelos
dois talentos prodígios. Para o ego e a competitividade de alguém, isso dói
muito. Desde então, mesmo tentando, a Fênix não conseguiu novos títulos e ficou
sempre no campo da hipótese: “ah se tivesse um carro bom...”
Um ressentimento de 15 anos. Na explosão do momento, Alonso
deixou explícito o que pensa de Hamilton. O inglês não precisa retrucar porque
sempre soube disso e talvez seja recíproco. É natural se não for, porque o
tempo deu razão a Lewis para conquistar e dividir a atenção com outros
adversários menos intensos e mais estressantes, como Nico Rosberg e agora Max
Verstappen.
Para Alonso, é uma chance de uma mínima reparação. Por isso,
a cada disputa, roda com roda e entrevistas, não é apenas uma situação de
corrida. São 15 anos de uma temporada que mudou a carreira dos dois. Melhor
para Hamilton.
Isso também serviu para mostrar aos mais novos um pouco do
que era aquilo. Hamilton, com a segurança de ser o nome mais popular do esporte
no momento, tem nos títulos e na experiência a condição necessária para
responder a altura.
Sempre praticando os jogos mentais via imprensa, rádio e
gestos, Alonso nunca se furtou de ser o anti-herói e o vilão. Ele sempre teve
essa natureza mesmo agora, quando ficou mais divertido e carismático conforme
ficava cada vez mais longe das glórias. Ele sabe que irrita e por isso o faz.
Por isso também é único.
Quantas disputas épicas poderíamos ter nos últimos nove anos
se dessem um carro decente para Alonso? O que seria dessa rivalidade, que em um
ano já virou uma das maiores da história da categoria e digna de filme?
Perguntas que a F1 não quis responder.
Resta nos contentar com as migalhas que valem algum lugar
entre os 10 ou o pódio. Tudo bem. Não é sobre as posições, e sim sobre as
personalidades e o carisma.
Todo campeão precisa de um antagonista. Lauda e Hunt. Senna
e Prost. Hamillton e Verstappen. Rosberg. Alonso.
Os circuitos relevam muito mais que as qualidades técnicas
dos pilotos, como vocês já puderam entender, eu acho. Muito mais.
Até!